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Sobre aplicativos, amigos de amigos e decorações duvidosas

Afinal, qual a melhor forma de conhecer alguém?

Às vezes penso que certos assuntos nunca saem da roda de conversa entre amigas. Talvez o tempo, a forma e o tom mudem, mas debates abertos sobre alguns tópicos nos acompanham ao longo do tempo, do cinema, da música e daquelas perguntas desconfortáveis durante o jantar em família.

Afinal, qual a melhor forma para se conhecer uma pessoa?

Na minha roda de amigas, esse tema aparece constantemente, e, em tempos de aplicativos de relacionamento, é difícil decidir exatamente onde depositar energia ou se expor. Exemplo: tenho uma amiga que acredita piamente que os aplicativos não são uma boa opção, já que a maioria das histórias que ela escuta não acabam com finais "felizes" — seja lá o que isso signifique em 2024. Por outro lado, há outra amiga no grupo que hoje vive um relacionamento incrível com o namorado que conheceu através de um aplicativo.

Não sei se tenho uma opinião formada sobre qual é a melhor forma de conhecer alguém, mas o que sei é que, às vezes, se envolver com alguém que é "conhecido" de outra pessoa pode ser infinitamente mais complicado.

Vamos à história.

Era aniversário do namorado de uma das minhas melhores amigas, e estávamos comemorando em um bar de esquina numa quinta ou sexta-feira. Nesse dia — para a minha infelicidade — eu estava tomando cerveja artesanal, coisa que já tomei muito na vida, mas hoje sei que me leva para um lugar perigoso. Aquele lugar de falta de senso comum e de filtro, sabe? Lá pelas tantas, chega um amigo do aniversariante, vulgo, namorado da minha amiga.

Conversa vai, conversa vem, e me dei conta, depois de uns 10 minutos, de que estávamos flertando. Lembro que um dos assuntos foi como ele tinha "consciência de classe" mesmo sendo privilegiado. Assim, com todo o contexto da conversa, havia um cartaz gigante por trás dizendo: esquerdomacho.

Eu deveria ter parado por aí, mas aqueles 6 pints de cerveja já estavam com mais autoridade nas minhas escolhas do que o desejado. Nós nos seguimos no Insta e acabei topando ir a um bar próximo de onde estávamos para continuar a noite. Me despedi — temporariamente — e fui embora.

O que acontece: a parte mais difícil eu já tinha feito — consegui flertar — e, depois de uma hora, enviei uma mensagem para ele para saber se ele ainda estava por perto. Ele disse que passaria para me pegar em 5 minutos.

E foram 5 minutos mesmo. A partir daí, foi só um show sem fim de horrores.

No carro, começamos a conversar e a conversa já começou a ficar levemente estranha. Lá pelas tantas, ele me perguntou se poderíamos ir para a casa dele, e eu respondi que sim. Em seguida, veio a melhor parte: ele anunciou que ainda morava com os pais.

Ok, vamos pegar leve aqui e contextualizar que ele poderia facilmente morar sozinho. Morava com os pais por opção. Quando questionei o motivo, ele me respondeu: "Mas você mora em um apartamento de 400m²?"

Eu queria terminar essa crônica dizendo que foi isso e que pedi para ele me deixar em casa, mas lembrem-se: 6 pints e escolhas erradas. Quem nunca, né meninas?

Quando chegamos à porta do apartamento, ele me pediu para tirar os sapatos. Entramos em silêncio e fomos para o quarto dele, e, assim que entrei, tive um pequeno, leve, minúsculo e silencioso surto: havia, dentro daquele apartamento de 400m², um quarto com uma cama de s-o-l-t-e-i-r-o e uma parede gigante com uma coleção de Hot Wheels.


De repente, assumi uma postura de indignação, e confesso que não me lembro exatamente do diálogo que tivemos, mas tenho certeza de que falei algumas verdades sobre a decoração do quarto. Detalhe: o cachorro dele também estava com a gente.

Sei que, lá pelas tantas, ele deve ter cansado de me ouvir falar, e, com toda a educação, disse: “Acho melhor você pedir um Uber.”

No dia seguinte, íamos para a casa de campo do namorado da amiga que estava de aniversário — amigo dele — para passar o fim de semana. Lembro que minhas últimas palavras foram:

— Você vai para Campos amanhã? — Acho que não. — É, acho melhor você não ir.

Saí daquele apartamento gigantesco com uma raiva tão grande que nem por um segundo parei para pensar que ele não era um cara que eu conheci em um aplicativo e que, talvez, eu nunca mais o veria na vida. Ele era amigo de uma pessoa próxima.

Sim, no outro dia, acordei com um remorso tão grande que liguei para as minhas amigas para contar o desfecho da noite — elas nem faziam ideia de que havia começado — e, comigo em uma ressaca moral quase que mortal, as duas se deliciaram com a minha triste experiência, rindo muito pelo telefone.

Tentando manter o mínimo de convívio saudável, mandei uma mensagem para ele pedindo desculpas pelo meu comportamento e opinião exagerada, mas nunca tive uma resposta.

Fiquei me perguntando se, no dia seguinte, ele pediu para a mãe o contato de uma arquiteta para uma reforma completa no quarto, a começar pela cama de solteiro.

O que tiro dessa experiência semi-traumática é que, sim, os aplicativos são, na maioria das vezes, impessoais e nem sempre terminam em grandes experiências, mas a velha mania de se envolver com conhecidos de conhecidos — o que acontecia basicamente em 90% das vezes antigamente — é ainda mais assustadora, porque o simples fato de saber que você vai encontrar essa pessoa de novo é apavorante.

Acho que vou concluir dizendo que não existe um caminho seguro para conhecer alguém e que as experiências podem ser traumáticas ou memoráveis, independentemente de onde comecem. A verdade é que precisamos apenas entender que nem todo encontro vai ser ótimo e que muitos deles não serão nem mesmo razoáveis.

E, no fim, sempre vai ter uma boa amiga para ligar e te lembrar que a vida continua acontecendo, que você ainda vai viver experiências piores — e melhores — e que vai rir muito alto da sua cara.

Acho que esse é o outro tópico que nunca sai da roda de qualquer conversa entre amigas: o apoio que temos, independentemente do roteiro sair do controle.

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